Da vulnerabilidade à dominação: modernização, mudança climática, migração, precarização do trabalho e desagregação familiar da população rural do Vale do Jequitinhonha, Brasil

Resumo

O objetivo inicial desta pesquisa foi compreender as consequências socioeconômicas do processo de modernização da colheita da cana-de-açúcar sobre a população rural do Vale do Jequitinhonha no estado de Minas Gerais, Brasil. Essa população é formada por classes populares brasileiras que passaram por um processo histórico de expropriação e exploração territorial, em grande parte realizado pelo Estado. As famílias que as compõem desenvolveram estratégias de reprodução social a partir da migração, temporária ou permanente, para trabalhar nas regiões mais desenvolvidas do país. À época inicial da pesquisa, os trabalhadores rurais migrantes temporários tinham na colheita manual de cana-de-açúcar sua fonte de renda assalariada e sentiam-se ameaçados com o inexorável processo de mecanização e o consequente fim da migração para trabalhar nas usinas canavieiras do estado de São Paulo. A pesquisa sobre o impacto desse processo no emprego de trabalhadores rurais trouxe à tona outro fator importante que condicionou a migração local, a saber, a mudança climática, pela seca e escassez hídrica crescentes, percebida pelos agricultores na alteração do ciclo das chuvas, e no aumento da temperatura. A modernização e as mudanças climáticas contribuíram, portanto, para que os agricultores ficassem mais expostos às mudanças contemporâneas no mercado de trabalho. A essas duas maiores questões acrescentam-se a desagregação familiar dos camponeses e a precarização do trabalho em um processo de dominação crescente de indivíduos em condição de vulnerabilidade social. A hipótese de adaptação dos trabalhadores a essa nova realidade, com a diversificação dos fluxos migratórios, que substitui a hipótese de desemprego avassalador, levou-nos a construir o conceito de uma “migração adaptativa” face à diminuição e precarização do emprego.